Na pequena comunidade litorânea de São Brás, onde as rochas aprendem a língua do mar, corria uma história ensinada como parábola pelos mais velhos. Diziam que, tal como as marés, o coração da casa também avança e recua. Quando o trabalho aperta, cada gesto revela o que se esconde na areia: orgulho, cuidado, ou a coragem de recomeçar. Nesta parábola, o vento sopra perguntas e o sal grava respostas, para que jovens e adultos guardem no peito a sabedoria do conviver.
Para que ninguém se perdesse no enredo, o velho do farol, homem de oração e silêncio, apresentava a trama com nomes e papéis claros. Porque numa parábola, objetos ganham sentido e pessoas tornam-se sinais; e assim, o cotidiano abre espaço para a graça e para o aprendizado. Na beira do cais, ele repetia que nenhum remo navega sozinho, e nenhuma enxada abre a terra sem mãos unidas em paciência.
Tema central: união e perdão no seio da casa, com seus desafios intergeracionais. Na maré baixa dos desentendimentos, cresce a tentação de medir o valor de cada um pelas falhas do outro. A parábola pergunta se a família é porto ou tribunal. E, como quem varre o chão do coração, convida a reconhecer que apoio mútuo não é ausência de conflito, mas decisão de permanecer e recomeçar juntos, oferecendo tempo, escuta e misericórdia.
Clímax: numa noite de vento contrário, a rede arrebentou, o casco rachou e o poço da vila cedeu. Cansados, Mateus e Tomás discutiram no pátio: o pai acusou a inexperiência do filho, o filho julgou o pai por teimosia. Nesse momento, Seu Nilo bateu ao portão pedindo um pouco de água e pão. Entre a urgência da casa e a necessidade do vizinho, o silêncio pesou. Do alto, o farol soou três toques, como quem diz que a rota se decide pelo coração que se ilumina.
Desfecho: Elisa trouxe a última broa e a dividiu em fatias finas, enquanto Dona Rosa encheu um cântaro com a água que restava. Mateus respirou fundo, entregou a Tomás o martelo e pediu perdão pela aspereza; Tomás devolveu com um abraço, reconhecendo sua impaciência. Pai e filho desceram ao cais e, com a vila reunida, o remo serviu de calço e a enxada virou alavanca: consertaram o casco e, ao amanhecer, ergueram um mutirão para o poço. O farol apagou-se com o sol, não por falta de luz, mas porque a claridade já brilhava nos rostos.
Então o Guardião falou com mansidão, sem erguer a voz: quando a casa parte o pão com o vizinho, cura as fendas por dentro; quando pede perdão, as ondas da culpa perdem força; quando escuta os sonhos dos mais novos, a tradição deixa de ser peso e torna-se trilha. Na praia, alguém comentou que marés cheias virão, e também vazantes; mas laços firmes se fazem no tempo em que nos sentamos lado a lado para reparar, e não para apontar dedos.
Lição moral: família é oficina de conversão diária. Onde cada um oferece o melhor e pede perdão pelo pior, os dons se somam e os fardos se repartem. Quem guarda rancor fica como barco preso à areia; quem partilha e reza juntos encontra vento favorável. Apoio mútuo não elimina tempestades, mas transforma cada noite difícil em amanhecer possível, pois a luz que o farol acende fora só confirma a chama que Deus deseja acesa dentro de casa.



