A Ponte de Pedra
Leituras Espirituais » Para refletir » A Ponte de Pedra

A Ponte de Pedra

Numa pequena aldeia pousada no alto de uma montanha, as casas pareciam ninhos agarrados às rochas, e as vozes trazidas pelo vento formavam um mosaico de costumes, cantos e crenças. Havia ali um jovem impetuoso, rápido no juízo e lento no escutar, que desprezava o modo de ser dos outros. Reclamava dos sotaques, zombava das receitas, estranhava as orações. Para ele, tudo o que não fosse o seu jeito parecia ameaça. O velho sábio da aldeia, silencioso como quem lê os cumes, observava e rezava por aquele coração apressado.

Uma tarde, o sábio chamou o jovem para caminhar até a antiga ponte de pedra, orgulho dos antepassados. Mostrou-lhe as pedras de tamanhos diferentes, unidas num único arco, e contou que cada pedra, mesmo imperfeita, tinha o seu lugar na travessia. O rapaz riu, dizendo que a ponte seria mais firme se todas fossem iguais. O ancião sorriu e, com paciência, respondeu em tom de parábola: alguns viam apenas pedras, outros viam um caminho. Depois, murmurou como quem planta uma semente no coração do outro: quando um se julga inteiro, o corpo padece. E citou, baixinho, lembrando a fé da aldeia:

Se um membro sofre, todos sofrem com ele; se um é honrado, todos se alegram com ele. Muitos membros, um só corpo.

Nessa mesma noite, o céu rugiu. Chuvas impiedosas desceram pelos paredões, e um estrondo rasgou o silêncio: a grande ponte cedeu num de seus apoios, e o rio bravo ameaçou arrancá-la. Sem a ponte, a aldeia ficaria isolada, os doentes sem remédio, a colheita sem caminho. O jovem, tomado pelo ardor do comando, reuniu apenas os seus amigos e expulsou os demais da margem: “Vocês atrapalham!”, gritou. Construíram apressados um andaime e amarraram cordas mal trançadas, enquanto o rio, surdo a bravatas, subia e lambia as bases da estrutura.

Logo a primeira corda partiu, e o andaime inclinou-se como palha. Uma tecelã do outro bairro, conhecida por seus tapetes de nós firmes, sugeriu um laço que o rapaz desconhecia; um pastor de outra encosta, acostumado aos ventos, ensinou a ler a correnteza; um pedreiro de crença distinta soube a medida certa das cunhas para calar a pedra que tremia; mulheres que cultivavam ervas prepararam infusões que devolveram o fôlego aos que trabalhavam. O jovem quis calá-los, mas os olhos viram o que o orgulho não queria admitir: cada diferente trazia uma peça do mesmo quebra-cabeça, e a ponte respondia melhor quando muitas mãos, em ritmos diversos, obedeciam ao mesmo bem.

O velho sábio ergueu a voz apenas o suficiente: “Escuta, filho, o rio não teme bravura, mas respeita sabedoria unida”. O rapaz, cansado de fracassar, respirou fundo, engoliu a vaidade e pediu: “Ensinem-me”. E então organizaram turnos, aceitaram os nós da tecelã, os cálculos do pedreiro, as leituras do pastor, a prudência dos mais velhos e a coragem dos mais novos. Uns rezavam pedindo ânimo, outros entoavam um canto antigo para marcar o compasso; entre martelos e preces, levantaram muros de gabiões, desviaram temporariamente a corrente, assentaram a pedra-chave. Ao amanhecer, a ponte, antes vacilante, repousava firme sobre bases reforçadas, como quem recorda que o arco se sustenta quando cada pedra abraça a outra.

De pé sobre a travessia salva, o jovem chamou a aldeia. Com a voz embargada, pediu perdão aos que havia desprezado. O sábio, com ternura, explicou: o respeito não significa concordar com tudo, mas reconhecer no outro um dom que Deus semeou para o bem de todos. Jesus, disse ele, não temeu sentar-se com os diferentes, e fez de um samaritano sinal de misericórdia. Tolerância não é tolerar como quem sofre; é amar como quem vê a dignidade e constrói espaço para que o bem do outro floresça. E a fé se alegra quando os dons, mesmo variados, servem ao mesmo Amor.

Desde então, a aldeia subiu a montanha com passos mais leves. As línguas viraram canções, os ofícios tornaram-se pontes, e o jovem aprendeu a ouvir antes de falar. Moral aprendida e partilhada nas rodas do fogão: quem trata a diferença como ameaça derruba pontes; quem acolhe com respeito e humildade constrói caminhos onde Deus passa. E cada vez que a chuva ameaça, todos correm juntos, porque já sabem: no alto da montanha, a travessia é obra de muitas mãos e de um só coração.

0 0 votos
Article Rating
Inscrever-se
Notificar de
guest
0 Comentários
Mais votado
mais recentes mais antigos
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários

Categorias

Textos recentes

0
Adoraria saber sua opinião, comente.x