Raízes para a Segunda-Feira
Leituras Espirituais » Para refletir » Raízes para a Segunda-Feira

Raízes para a Segunda-Feira

O bosque respirava em compassos longos, como se cada folha tivesse aprendido com a eternidade a cair sem pressa. Elías entrou no caminho de terra como quem busca uma capela silenciosa. Trazia nos ombros o peso das metas, gráficos que sobem e descem como marés inquietas, e uma fé que, ultimamente, parecia ter ficado presa entre planilhas. Ali, entre troncos antigos e o rumor suave de um riacho, ele desejou encontrar um fio que reunisse trabalho, fé e sentido.

Foi quando ouviu passos leves. Uma menina surgiu entre os carvalhos, os olhos brilhando de descoberta. Era Lia, que carregava um punhado de musgo, como se fosse um tesouro. Ela olhou para Elías e perguntou, sem cerimônia: Você está procurando alguma coisa que se perdeu? Ele sorriu cansado e respondeu que talvez buscasse respostas para perguntas que o escritório não conseguia responder. Lia inclinou a cabeça, como quem cheira uma flor nova, e disse: As árvores respondem devagar. Você consegue esperar?

Elías sentou numa raiz grossa que parecia um banco talhado pela paciência do tempo. O ar perfumado de resina e terra falava de algo firme. É isso que me falta, pensou, firmeza. Lia se aproximou e correu os dedos pelo tronco: Vê como as raízes não aparecem? Ele assentiu. Elas trabalham o dia inteiro e quase ninguém percebe. No seu trabalho também tem coisas que ninguém vê, mas sem elas nada fica de pé. Elías sentiu um arrepio discreto, como se o bosque confirmasse, com um silêncio cheio de presença, aquilo que a menina dizia.

Eu fico nervoso lá, confessou Elías. As reuniões viram disputas, as mensagens chegam como flechas, e eu esqueço de Deus na velocidade dos prazos. Lia escutou, as mãos ainda sobre a casca rugosa. Meu avô me ensinou uma oração curtinha para quando o coração corre mais rápido que a esperança, disse, e abriu espaço ao lado para que Elías encostasse a testa no tronco. O vento soprou como um suspiro. Então ela murmurou, e ele repetiu em silêncio:

São José, patrono dos trabalhadores, ensinai-me a trabalhar com amor, em silêncio e justiça, oferecendo a Deus cada tarefa do meu dia.

A oração, pequena como uma semente, caiu na terra do peito de Elías. Ele lembrou que Jesus, antes de curar multidões, passou anos a fio numa oficina, tornando liso o que era áspero, medindo tábuas, varrendo o chão de serragem. Se Deus não teve pressa de apressar, pensou, por que eu me deixo sequestrar pela urgência que não salva? Lia, como se ouvisse o pensamento, apontou para as copas: As folhas trabalham, mas também dançam. Você trabalha e esquece de dançar?

O bosque se tornou, para Elías, uma sala de reunião diferente. Não havia projeções, mas havia luz filtrada. Não havia pauta, mas havia sentido. Ele contou a Lia sobre o colega que falava alto para ser notado, sobre a funcionária nova que parecia invisível, sobre a culpa que carregava ao chegar tarde para a família. Lia ouviu como quem recolhe conchas. Minha mãe diz que fé é quando a gente dá nome ao amor e o convida para a mesa, disse. Se você convidar a fé para a sua mesa de trabalho, ela vai ensinar a dividir o pão do tempo e da atenção. As palavras encontraram nele um lugar preparado pela sede.

No clímax daquela conversa, algo se acendeu. Elías percebeu que a fé não era um quadro pendurado na parede do domingo, mas uma respiração para todas as horas; não um conjunto de regras guardadas na gaveta, mas um modo de ver e de tocar o mundo. Com olhos que aprendem a ver Deus na rotina, seu e-mail deixa de ser tiro e vira ponte; sua mesa deixa de ser trincheira e vira altar. Ele imaginou começar o dia oferecendo, em silêncio, cada tarefa como um gesto de amor; pedir perdão quando ferir; elogiar quando for justo; recusar a maledicência como se recusa um alimento estragado.

O bosque o ensinava por parábolas naturais: as raízes como fé, a sombra como descanso legítimo, o tronco reto como ética, os galhos entrelaçados como colaboração. Ele pensou nos primeiros cristãos, que chamavam seu trabalho de serviço, e sentiu vontade de fazer do seu escritório um lugar de refúgio e respeito. Lia, contente, acrescentou: Quando você levar essa calma para lá, ela vai se multiplicar. É como quando a gente faz silêncio: de repente dá para ouvir o riacho que sempre esteve cantando.

Elías pediu a Lia que o ajudasse a transformar o bosque em gestos concretos. A menina, com a sabedoria simples de quem aprende rezando e brincando, foi numerando nos dedos, e ele registrou no coração como um compromisso novo:

  • Começar o dia com uma oração breve, oferecendo o trabalho a Deus e lembrando os nomes dos colegas.
  • Proteger tempos de silêncio e foco, sem idolatrar a urgência.
  • Escolher palavras que curem, evitando a ironia que fere.
  • Reconhecer o esforço alheio com gratidão sincera.
  • Ser justo nas decisões, lembrando que resultados têm rostos.
  • Fazer pausas humanizadoras: um copo d’água, um respirar, uma breve leitura de um salmo.
  • Encerrar o expediente entregando a Deus o que ficou incompleto, sem culpa, com confiança.

O sol começou a declinar, derramando ouro pelas frestas das folhas. Elías sentiu que algo se ajeitava dentro dele, como uma estante finalmente nivelada. Agradeceu ao bosque e a Lia. Você mora aqui?, perguntou. Ela riu: Moro onde tem gente que escuta. Ele prometeu levar aquele ouvir para a próxima segunda-feira — e para todas as outras. Antes de partir, traçou discretamente o sinal da cruz, e o gesto pareceu abraçado pelas árvores.

Ao deixar o bosque, Elías não carregava respostas prontas, mas um caminho. Compreendeu que a fé influencia o modo como lidamos com as pressões: não as nega, mas lhes dá lugar e medida; não apaga o cansaço, mas o repousa em Deus; não elimina conflitos, mas os atravessa com mansidão e justiça. Ele viu, com uma alegria sóbria, que a beleza das pequenas coisas — o bom dia sincero, a mesa organizada, o cuidado com quem sofre — era mais forte do que o barulho de metas. E decidiu cultivar, no ambiente de trabalho, um espaço saudável e respeitoso, onde cada pessoa pudesse ser tratada como obra do Criador.

Quando a cidade voltou a cercá-lo com seus semáforos e buzinas, o canto do riacho ainda ecoava por dentro. Elías caminhou para casa como quem leva resina nas mãos, aquele cheiro que lembra árvores e promessa. No dia seguinte, ao abrir a porta do escritório, ele respirou fundo e repetiu em silêncio: Trabalho não é um peso sem música; é a minha participação na obra de Deus. E, lembrando-se de Lia, resolveu dançar um pouco, mesmo que ninguém visse — não com os pés, mas com a alma: firme como tronco, flexível como galho, e, sobretudo, enraizado na fé que, invisível como as raízes, sustenta tudo o que permanece.

5 1 voto
Article Rating
Inscrever-se
Notificar de
guest
0 Comentários
Mais votado
mais recentes mais antigos
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários

Categorias

Textos recentes

0
Adoraria saber sua opinião, comente.x